segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Balanço da Série Arte e Cultura de Paz - 17/01 a 21/01/2011


O Programa Por Uma Cultura de Paz realizou, entre os dias 17 e 21 de janeiro de 2011, uma série de programas radiofônicos experimentais sobre Arte e Cultura de Paz. A programação foi transmitida ao vivo na Rádio Universitária FM 107,9 MHz da Universidade Federal do Ceará (UFC), de segunda a sexta, às 15h, e pôde também ser acompanhada pela internet no site www.radiouniversitariafm.com.br . A produção e a apresentação do Por uma Cultura de Paz é da radialista e jornalista Marta Aurélia, que contou naquela semana com a colaboração do músico e estudante de Comunicação Social/Jornalismo da UFC, Marco Leonel Fukuda.

A tônica das reflexões dessa série semanal era se a arte contribui ou pode contribuir para a cultura de paz. Então, se a arte contribui para a cultura de paz, de que maneira isso ocorre? Para cada dia, os convidados traziam essas reflexões gerais do fazer artístico, do trabalho cotidiano na cultura, além de conversarem sobre especificidades de suas linguagens artísticas, de detalhes dos seus projetos, das suas trajetórias. Tudo isso em um programa com uma hora de duração, dividido em dois blocos por uma edição radiojornalística do Universitária Notícia às 15h30.

A música também exerce um papel fundamental no programa Por uma Cultura de Paz. A música não é só recurso técnico para cobrir o silêncio (os "buracos" de locução, as pausas, a ausência da voz humana no sinal radiofônico) do qual o rádio tem pavor, para fazer as transições entre os quadros do programa e também não é jogada aleatória e despropositadamente no ar. É um aspecto relevante discutido na hora de produzir o programa, de elaborar a pauta, de se pensar a comunicação, o conteúdo do texto radiofônico, o jornalismo veiculado pelas ondas do rádio. A música é tratada como informação, quer seja pela mensagem cantada na letra, ou pela atmosfera gerada nas peças instrumentais, normalmente utilizadas como "BG" (background, ou seja, fundo musical para a fala). Música é informação estética, sonora que é complementar a informações oriundas das mais variadas fontes. A seleção musical forma uma teia de discursos, trama que dialoga com a temática do programa diário de rádio, com o desenrolar da entrevista, com os assuntos que são desenvolvidos nas falas do convidado, coordenado com as intervenções do locutor/radialista.

Na segunda, dia 17/01, o convidado foi o percussionista Daniel Leão, pernambucano, radicado no Ceará, músico e praticante do candomblé. A música selecionada para a abertura do programa foi o afro-samba "Canto de Xangô" de Baden Powell e Vinícius de Moraes, na voz de Monica Salmaso. A temática do programa era arte e espiritualidade, com ênfase na música. Valores como tolerância religiosa, respeito às diferenças e à diversidade cultural foram trazidos como caminhos para a promoção da paz. Daniel Leão levou o seu atabaque e executou ao vivo ritmos característicos para os orixás Oxum e Exu, além do tradicional ritmo afro-brasileiro ijexá. Falou sobre práticas espirituais de candomblé, umbanda, espiritismo e suas relações com música, citando exemplos de religiosidade nos maracatus e nos afoxés. Foram entrevistadas por telefone a maestrina Izaíra Silvino e a cineasta Verônica Guedes. Izaíra Silvino falou da arte, que retrata a grandeza humana, e o canto coral como prática musical coletiva, projeto de sociedade possível. Verônica Guedes, organizadora do Festival ForRainbow de Cinema e Diversidade Sexual, comentou sobre a importância da não-discriminação, independente de raça, cor, credo, gênero, orientação sexual e convidou para o manifesto "A cidade é um bem público" no Theatro José de Alencar, pela revitalização e pela pacificação do centro de Fortaleza. A classe artística cearense dirigiu o seu apoio e a sua solidariedade à Luiza Perdigão, secretária do Centro, que sofreu ameaças por iniciativas de combate à pirataria e ao comércio ambulante. A música que encerrou o programa foi "Retumbante" de Edinho Vilas Boas, do CD do movimento Bora! Ceará Autoral Criativo. "Retumbante", no seu arranjo, faz uma junção de voz, palmas, percussão, batuque.

Na terça-feira, 18/01, os convidados eram a fanzineira Fernanda Meireles e o escritor e compositor Alan Mendonça. Ambos formaram-se em Letras e fizeram especialização em Arte-Educação, apaixonados por literatura e pela escrita de cartas. A música de abertura do programa foi "Ai que saudade d'ocê" de Vital Farias. A conversa fluiu entre palavra escrita, textos literários, até chegar na música novamente. Foi um programa leve, apesar de terem sido abordados temas complexos como os conflitos interiores do artista no momento de criação, a obra de arte que não revela o caráter de conduta do criador, as dificuldades de acesso a recursos, a limitação de espaços para arte, as perspectivas e os desafios para o trabalho artístico autoral. Fernanda sugeriu a valsa "Arlequim" de Ayrton Pessoa, do grupo Os Argonautas e dedicou a uma amiga que estava doente no Rio de Janeiro.

Na quarta-feira, dia 19/01, a convidada era a escritora, artista plástica Ana Waleska Maia, formada em Direito, que falou sobre o feminino, arte e questões de gênero. Sorteou dois livros de sua autoria para os ouvintes que ligaram e participaram do programa. A convidada abordou desde assuntos da seara jurídica, dos direitos, acesso à justiça, bem comum, pacificação dos conflitos da sociedade, até a sensibilidade feminina, a arte como atividade para o ser humano estabelecer o seu lugar no mundo, uma manifestação do espírito criativa e existencial. O background do programa era a trilha sonora do filme "O fabuloso destino de Amélie Poulain" do compositor francês Yann Tiersen. Badi Assad, grande violonista brasileira, tocou "Emotiva n°1" de Hélio Delmiro. No final do programa, ouvimos "Solo feminino" de Pingo de Fortaleza e Alan Mendonça, cantado pelo quinteto vocal feminino Cinco em Ponto.

Na quinta-feira, dia 20/01, os convidados eram Gilano Andrade, coreógrafo da EDISCA, e o professor indiano Harbans Arora, físico quântico, professor aposentado da UFC. O BG era de peças do violonista e compositor cearense Manassés de Souza, que também compõe trilhas sonoras para os espetáculos de dança da EDISCA, uma entidade que realiza há 19 anos um trabalho de inclusão social através da arte com jovens da periferia de Fortaleza. A EDISCA estava no mês de janeiro em cartaz com o seu mais novo espetáculo, "Sagrada", no Teatro do Shopping Via Sul e houve espaço no programa para falar do projeto, divulgar a agenda e convidar os ouvintes.

"Sagrada" também foi objeto de uma matéria aqui no blog Cultura Ciliar, de um espetáculo de dança que fala da relação da arte com o meio ambiente, do ser humano com a natureza e todos os seres vivos.

O prof Harbans Arora falou de tomarmos C.A.F.É (reunirmos ciência, arte, filosofia e espiritualidade com "e" acentuado). O professor falou de como a civilização ocidental, que costumeiramente realiza divisões de todos os tipos, separou muito os hemisférios do cérebro humano, utilizando muito mais o lado esquerdo do cérebro, analítico, racional, do raciocínio lógico, em detrimento do direito, das emoções, dos sentimentos, da subjetividade. É preciso uma integração dinâmica entre esses dois hemisférios, como no caso de bater palmas, em que juntamos os dois lados em equilíbrio dinâmico, ao invés de equilíbrio estático de mãos reunidas para a oração, para a reverência religiosa. O professor Harbans sugeriu a música "Graça divina" de Gilberto Gil, comentando no trecho da letra: "um pé na farmácia, outro no amor", a harmonização da Medicina racionalizada, do intelecto com o amor, o lado sentimental. No programa, continuamos a conversar sobre desenvolvimento humano, formação humana, educação, paz, arte, cultura, até Marta ter a ideia (aquele insight, momento de inspiração, de presença de espírito) de arrematar a edição de quinta com "O som da pessoa" de Gilberto Gil e Bené Fonteles ("toda pessoa boa soa bem"), encontrando pelo computador essa música no acervo da rádio.

Sexta-feira, dia 21/01, último programa da Série Arte e Cultura de Paz, foi sobre teatro. Marcelo Drummond e Beto Mettig foram convidados para falar sobre a vinda do Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona, grupo de SP, dirigido por Zé Celso Martinez Correia há 52 anos.

Aqui no blog Cultura Ciliar há uma postagem da carta aberta que Zé Celso enviou ao governador do Ceará, Cid Gomes, e outra postagem sobre a temporada de janeiro 2011 do Teatro Oficina aqui em Fortaleza.

O ator, diretor teatral e professor do curso de Artes Cênicas do IFCE, Thiago Arrais, também foi convidado para o programa. Na seleção musical, canções de Letícia Coura, cantora e também atriz do Oficina, além de Hermeto Pascoal no BG. Na semana seguinte, o Teatro Oficina apresentou quatro dias de ritos-espetáculos no Centenário Theatro José de Alencar com a série Dionizíacas. A proposta do Teatro Oficina é trabalhar o Teatro de Multidão, acessível para muita gente ir ao teatro, como se fossem à praia ou ao estádio de futebol. Não há distinção hierárquica entre atores e plateia, o público é convidado a participar da peça encenada. Thiago Arrais fez o mestrado na Universidade de São Paulo (USP) sobre esse trabalho do Teatro Oficina e foi assistente de produção do grupo por dois anos. A conversa seguiu para a produção do teatro cearense, a organização da classe artística, que participou ativamente dos Fóruns Gerais de Linguagens Artísticas em 2010, que elaborou o Pacto pela Cultura no Ceará, petição pública online, aqui neste blog publicada na íntegra.

O ator Marcelo Drummond ressaltou que o teatro pode levar à realização da paz, por ser um exercício de alteridade, de representar papeis de todo o espectro de sentimentos e personalidades do ser humano, de pensar e sentir, se colocar no lugar de outro. O ator, dependendendo do trabalho, prosseguiu Marcelo Drummond, pode interpretar desde um serial killer até um pacifista como Mahatma Gandhi, Martin Luther King ou Nelson Mandela.

Foi uma semana intensa de aprendizado, de se fazer na prática um programa de rádio, aplicando conhecimentos adquiridos nas aulas de Jornalismo da UFC. O aprender se fez possível observando as falas dos convidados, atendendo os telefonemas, para anotar comentários, perguntas dos ouvintes, nome, ocupação, bairro de origem de quem recebia em casa, no trabalho, ou no trânsito o conteúdo que estava sendo transmitido pela Rádio Universitária. Foi muito interessante notar o amplo alcance que o rádio possui como ágil e barato meio de comunicação de massa que, apesar de inicialmente ter sido criado para fins militares, bélicos, houve uma radical e contrária mudança em sua utilização através de iniciativas como a série radiofônica que acabamos de descrever, circunstância na qual podemos veicular uma seleção musical cuidadosa, variada, uma produção de pauta elaborada, um texto radiofônico bem redigido e tratar de assuntos como arte e cultura de paz.


Marco Leonel Fukuda
Músico e estudante de Jornalismo.

Para saber mais:

Site da Rádio Universitária FM - Universidade Federal do Ceará (UFC)
http://www.radiouniversitariafm.com.br/oktiva.net/2213/?pagOrigem=pagCapa&idWebSite=2213&acao=mostrarMateria&idNota=160650

http://culturaciliar.blogspot.com/2011/01/fonte-httpwww.html

Foto: www.acertodecontas.blog.br

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